quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Nan Goldin

Entrevista conduzida por Daniel Blaufuks a Nan Goldin
#Jornal Expresso, 1 de Novembro de 2008


Sel portrait in red; Zurich 2000

Penso que foi um dos primeiros fotógrafos que começou a usar a cor como afirmação artística e vejo uma relação do seu trabalho com a obra de William Eggleston, um mestre da cor. Nessa época conhecia o trabalho dele?
Antes de ir para a escola de artes, quando fiz as primeiras fotografias a preto-e-branco, não sabia nada. Mas depois conheci o trabalho de bastantes fotógrafos. Tive um professor maravilhoso que me falou de Larry Clark, Arbus, Weegee, e de tantos outros.

O seu trabalho tem para mim uma qualidade particular: quando observo as suas fotografias sinto vontade de pegar na máquina e começar a fotografar. nem todos os fotógrafos, independentemente da qualidade, têm esse poder. Embora tenha vivido numa comunidade muito específica, há uma identificação imediata com o seu mundo. É sempre sobre a nossa cultura.
É sobre uma certa tribo. Encontram-se em todo o lado, Berlim, Tóquio... Fico irritada quando me falam da "The Balad ..." como se fosse um certo tipo de gente marginal do Lower East Side. Não éramos marginais, mas não nos interessava falar com gente formal. Nós éramos o mundo.

Esse foi o mundo que fotografou. O modo como o faz é muito terno, se é que posso usar essa palavra.
Espero que sim. Tiro fotografias para agradar tanto aos meus amigos como a mim próprio. Isto não começou como um projecto fotográfico. O meu primeiro desejo era pôr as "darg queens" na capa da "Vogue", porque pensava que eram muito mais bonitas do que mulheres. Nunca usei uma fotografia de que não gostassem. Não pensava em mim como fotógrafa. Tiro as fotografias, publico-as e depois as pessoas dizem-me do que é que se trata. As imagens saem-me directamente do estômago e do coração, não são o resultado de uma ideologia qualquer. Leio depois as críticas e se gosto de alguma frase, uso-a.


Simon laughing; Avigon 2001

Como é que se desenvolveu o trabalho?
Nos anos oitenta viajei pela Europa a projectar os meus diapositivos por trezentos dólares. Esse trabalho é a base de "The Ballad...". As pessoas conhecem o meu trabalho só a partir desse livro, mas o livro surge dessas projecções. Estas fotografias não eram mostradas em galerias. Começaram por ser vistas em clubes nocturnos e, mais tarde, em museus. Berlim tornou-se uma parte importante do meu percurso porque a primeira vez que mostrei o meu trabalho as pessoas vinham ter comigo e perguntavam se podiam fazer parte da minha família. Acabei por viver lá.

(...)
Sei que começou a fotografar porque queria sentir-se viva.
Quis fazer uma história da minha vida, que não pudesse ser reescrita. Cresci num lugar muito religioso, onde não se falava de certas coisas. Cresci nos subúrbios. De um lado estavam os judeus, do outro os católicos.

Uma das fotografias que prefiro foi tirada em Portugal. É a imagem de umas velas a arder em Fátima. Penso que não tem nada e simultaneamente tem tudo a ver com o resto da sua obra. Mostra sofrimento sem o mostrar verdadeiramente e também nos enche de optimismo e fé, mesmo que não estejamos a falar necessariamente de religião. É uma fotografia muito especial.
É uma das minhas fotografias favoritas de sempre. É sobre a sida. Costumava acender uma vela por cada pessoa que estava doente. Pensei que assim as poderia manter vivas durante mais tempo.


Fatima candles; Portugal 1998

(...)

Apesar de viver na Europa, quais são as suas expectativas para estas eleições? Penso que estará a torcer por Obama...

Não tenho nenhuma fé. Como é que um homem negro pode ganhar as eleições? Não há forma de Obama poder ganhar as eleições. Querem que acreditemos que vai ganhar mas, depois, à última hora, vão roubar a eleição. Aconteceu exactamente o mesmo com Bush na Florida. O governador Jeb Bush conseguiu inverter a situação alterando os resultados. Essa foi, aliás, a razão que me fez sai de nova Iorque e vir para a Europa. Se Obama ganhar, vai ser assassinado.

Neste momento as sondagens prevêem a sua vitória.
Há uma parte de mim que ainda acredita, mas dado o que vem vindo a acontecer nos Estados Unidos desde John F. Kennedy, é quase impossível pensar que possamos regressar a uma ideia de América maravilhosa e inocente que não seja controlada pelas grandes empresas e por todos os tipos de polícias secretas que nem sequer conhecemos. Eles não vão deixar que este homem inteligente e sensível... não sei...

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